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Vidigal: favela de resistência


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Ontem, dezenove de abril, uma foto circulou nas mídias sociais e causou bastante revolta. Tratava-se da imagem de um policial apontando uma arma para os moradores do Vidigal que repudiavam a carreata "Bovid-17". Um agente do Estado, lotado na UPP dessa favela, evidenciou a partir de sua atitude ameaçadora quem detinha o direito de se manifestar e quem deveria acatar. Outra fotografia, também registrada pela lente de Lucas Landau,  mas não tão divulgada quanto a primeira, exibia um dos motivos da ação excessivamente repressiva do policial: a imagem de um favelado dando dedos aos manifestantes. Porém, o que pode parecer motivação era reação.

Além dos desafios acarretados pela pandemia do coronavírus, o brasileiro tem que lidar com os desatinos de quem a ignora em defesa da estabilidade econômica. Inclusive, esse era o argumento gritado de dentro dos carros luxuosos para os moradores do Vidigal: “Estamos lutando por vocês, para que vocês possam trabalhar”.

Pois bem, o direito de viver precede qualquer outro. E, lutar por direitos é uma prática comum aos moradores do Vidigal, em especial daqueles que manifestaram sua indignação gritando "Fora, Bolsonaro" e jogando ovos, na tarde do último domingo, na altura do número 314 da Avenida Niemeyer. Afinal, esse é o endereço do início da favelização e resistência do Vidigal.

Há 42 anos os moradores do Vidigal sofreram uma tentativa de remoção. Os barracos localizados justamente nessa localidade do morro, o “314”, seriam destruídos e os favelados transferidos em caminhões da Comlurb para Antares, na zona oeste da cidade.  O argumento na época era que havia um perigo iminente de deslizamento de terras. Logo, a retirada dos moradores era para o bem dos mesmos.

Os favelados resistiram. Através da organização comunitária conseguiram apoio de juristas renomados como Sobral Pinto e Bento Rubião (nomes de ruas no morro) e provaram o verdadeiro intento dos poderosos (que também tinham o apoio da força policial): a construção de um empreendimento de luxo naquele local. De lá para cá, a Niemeyer foi cenário de vários outros atos de resistência e protagonismo da favela do Vidigal, desde a visita do Papa João Paulo II a manifestações que exigiam o fim da violência policial que motivaram o ato e hoje fórum “Parem de Nos Matar”.


Arquivo pessoal da autora. Chegada do Papa João Paulo II, 1980.

Arquivo pessoal da autora. Manifestação de moradores em decorrência do assassinato de Willian Mendonça, 2019.

Fica claro que a favela não precisa de porta-voz fascista. Sabemos o porquê de nossa luta. Nossas pautas não comungam com as de quem, pateticamente, clama pelo fim do isolamento social protegidos no interior de seus carros.  Certamente, a favela que não elegeu esse desgoverno (55% dos votos válidos no Vidigal foram para Haddad) não aplaudiria a carreata a favor de Bolsonaro, do fechamento do STF, da volta do regime militar e pelo fim do isolamento social, ocorrida em diversas cidades do Brasil.

Vidigal tem a resistência como marca e a democracia como bandeira. Basta lembrar que a luta contra a remoção de seus barracos ocorreu em plena ditadura militar. Então, a quem deseja “lutar por nós”, nos impondo a volta ao trabalho para a manutenção de vossas empresas, damos dedos como agradecimento e ovos como lembrança.


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